
pesquisaFAV | Os modos de se vestir das mulheres indígenas Inỹ Karajá
Pesquisa realizada por doutoranda da FAV envolve discussões interculturais e desafios metodológicos

Aldeia Fontoura/TO — Foto: Hawalari Coxini e Rafaella Coxini (2019)
INDUMENTÁRIA DE SENTIDOS
A pesquisa de doutorado Os modos de vestir das mulheres Inỹ Karajá na contemporaneidade: origem, tradição e invenção, da pesquisadora Indyanelle Marçal (29), iniciado em 2019, tem a intenção de refletir sobre os “sentidos” [significados, ideias] atrelados às formas de vestimenta das mulheres indígenas Karajá, considerando tanto os vestires tradicionais quanto os vestires não indígenas. Dessa forma, o estudo resgata a origem e o contexto histórico-cultural da relação entre os povos nativos com a ocupação urbana ocidental.
A doutoranda do Programa de Pós-graduação em Arte e Cultura Visual (PPGACV/UFG) possui vasta experiência em estudos sobre vestimenta, incluindo a participação no INDUMENTA: dress and textiles studies in Brazil, grupo da Faculdade de Artes Visuais da Universidade Federal de Goiás (FAV/UFG). Ainda assim, ela afirma que a pesquisa é “transformadora” e “um desafio” por envolver questões metodológicas interculturais.

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Museu Goiano Professor Zoroastro Artiaga (MUZA), Goiânia/GO — Foto: Hawalari Coxini e Rafaella Coxini (2022)
O povo Karajá é formado por habitantes seculares das margens do rio Araguaia. O nome Inỹ significa “nós” em sua própria língua, o inỹrybè. Já, o termo “Karajá” tem origem na língua Tupi e se aproxima do significado de "macaco grande". Foi uma grafia oficializada por meio dos relatos etnográficos de Fritz Krause em 1908, não sendo a nomenclatura original.
Segundo o Instituto Socioambiental — organização sem fins lucrativos que busca defender os bens e os direitos relativos ao meio ambiente e aos povos originários —, houve pelo menos duas frentes nas quais os Karajá tiveram contato com o restante da civilização, ambas expedições de bandeirantes. A partir daí, a relação do grupo junto à sociedade nacional se manteve.
Atualmente, conforme dados disponibilizados pelo projeto de Indyanelle e coletados pelo Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI), em 2020, a população estava distribuída em 27 aldeias que se estendiam pelos estados de Goiás, Tocantins, Mato Grosso e Pará. No total, são, hoje, 3768 pessoas (SIASI/SESAI, 2014).

Aldeia Santa Isabel do Morro/TO — Foto: Waxiaki Karajá
SUSPIRO EM TERRA ARRASADA
A autora do trabalho ressalta pelo menos três fatores que a impulsionam na realização da tese. O primeiro deles foi a ausência da temática indígena na matriz curricular da estudante durante a sua própria formação no curso de Design de Moda, aspecto que se repete em várias instâncias do ensino superior.
O segundo motivo é a quantidade incipiente de estudos no campo da indumentária indígena. E, em terceiro lugar, a importância de se pesquisar temas voltados para grupos marginalizados historicamente.
De acordo com a visão da especialista, a maneira pela qual alguém se veste é uma forma de comunicação, isto é, uma linguagem vinculada ao corpo na qual estão contidos elementos da cultura, da sociedade, da história e até mesmo de condições climáticas. Vestir-se produz significados.
DESCOBERTAS DE SI E DO OUTRO
Para a pesquisadora, o estudo tem sido “uma autorreflexão sobre [suas] próprias concepções muitas vezes naturalizadas como mulher”, ainda mais “diante de uma estrutura acadêmica a qual ainda possui como base o pensamento ocidental moderno”, complementa a doutoranda.
A orientadora da iniciativa, Dra. Rita Morais de Andrade, salienta: “foi necessário conduzir as etapas da coleta de dados com bastante atenção e cuidado às necessidades das mulheres participantes. Indyanelle foi muito zelosa dos aspectos éticos da investigação e isto teve um impacto positivo”.

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Aldeia Fontoura/TO — Foto: Hawalari Coxini e Rafaella Coxini (2019)
OS NÓS QUE SE ENTRELAÇAM EM INỸ
A colaboração entre indígenas e não-indígenas é um ponto de destaque no trabalho, conforme aponta Rita Andrade. Tanto que, um dos desdobramentos da pesquisa foi a exposição digital Ixitkydkỹ: um olhar sobre os vestires tradicionais das mulheres Inỹ Karajá. Uma rede extensa de profissionais esteve em volta da iniciativa: da curadoria de objetos — selecionados a partir do acervo do Museu Goiano Professor Zoroastro Artiaga, em Goiânia —, à identidade visual, direção, fotografia, tradução e produção de texto, sem contar as filmagens.
Outro desdobramento, e, para além das atividades técnicas, houve apoio de organizações e outras entidades, como o Instituto Precisa Ser e a grife de moda FARM. As duas patrocinaram um edital cujo resultado foi o curso Vestires Plurais das mulheres Inỹ Karajá, ofertado na modalidade de Ensino à Distância (EaD), e realizado em agosto de 2022.

Aldeia Fontoura/TO — Foto: Hawalari Coxini e Rafaella Coxini (2019)
AS MATIZES DO VESTIR
Ao carregar o nome de Ixitkydkỹ [vestir na língua materna dos Inỹ], o site da exposição aproxima o público, principalmente não indígenas da etnia Karajá. Ao longo da página, são encontrados fotografias e vídeos de penteados, adereços, ornamentos, entre outros acessórios, tudo acompanhado por suas devidas descrições físicas, contextos de uso, faixa etária, gênero, matérias-primas aplicadas na confecção e dimensões. As fotos são de autoria de Hawalari Coxini, Rafaella S.Coxini Karajá e Juanahu Inỹ.
A exposição é dinâmica e acessível, contando com relatos gravados os quais poderão ser ouvidos pelo público com deficiência visual e até mesmo jogos interativos — organizados por Bárbara Freire (coordenadora da exposição) e Vitória Avelar —. Um elemento de destaque, é que o texto de apresentação do site pode ser lido no idioma do povo originário, com a tradução de Sinvaldo Oliveira (Wahuka).

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Acervo do Museu Goiano Professor Zoroastro Artiaga (MUZA), Goiânia/GO — Foto: Hawalari Coxini e Rafaella Coxini (2022)
LEGENDAS
Serviços
Acesse a exposição: https://www.vestiresmulheresinykaraja.com/
Grupo de pesquisa: @indumenta.br
Contatos
Indyanelle Marçal: indy.mgarcia@hotmail.com
Rita Andrade: ritaandrade@ufg.br
PesquisaFAV é uma série textual com foco nos processos de pesquisa do cotidiano da FAV com o objetivo de popularizar a produção científica por meio de linguagem simples e acessível.
Fonte: Pedro Augusto - estagiário de jornalismo
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